DOENÇA DE PARKINSON

Epidemiologia:
A doença de Parkinson (DP) é rara em indivíduos com idades inferiores a 40 anos, sendo que a incidência da doença aumenta após os 60 anos, com uma idade média no diagnóstico de 70,5 anos. A prevalência mundial da DP é cerca de 1% acima dos 60 anos. Em 2016, estimou-se uma prevalência global de 6,1 milhões de indivíduos com DP , e parece ser mais frequente nos homens, pelo menos em alguns grupos etários.. A idade e história familiar de DP estão associados a maior risco, e o tabagismo possivelmente a menor risco. A maior parte dos casos de DP é esporádica, mas há evidência crescente do papel dos factores genéticos na fisiopatologia da DP, sobretudo em doentes com idade inferior a 50 anos. Só cerca de 5-6% dos casos de DP têm início antes dos 50 anos, e as mutações conhecidas explicam actualmente cerca de 6-7% dos casos de DP. Estão identificadas formas de DP autossómicas recessivas, dominantes, e ligadas ao X.

Sinais e sintomas:
Classicamente, a DP é considerada uma doença do sistema motor. No entanto, inclui também manifestações neuropsiquiátricas e outras não-motoras. O seu diagnóstico é clínico e assenta no pré-requisito de parkinsonismo, que reúne três características cardinais: a bradicinésia, em combinação com rigidez e/ou tremor de repouso. Apesar de a instabilidade postural ser muito comum em quadros de parkinsonismo, não constitui um critério de DP, e nesta ocorre em estádios mais tardios, enquanto que a sua presença precoce sugere um diagnóstico alternativo. Como critérios diagnósticos de suporte, incluem-se: resposta benéfica e dramática à terapêutica dopaminérgica; ocorrência de discinésias induzidas pela levodopa; tremor de repouso de um membro; hipósmia ou desenervação cardíaca simpática em cintigrafia MIBG.

Exames complementares de diagnóstico:
A RMCE convencional pode ser realizada para exclusão de anomalias estruturais (ex: hidrocefalia, tumor, enfartes lacunares) mas não é diagnóstica na suspeita de DP. Poderá ser útil em doentes com suspeita de parkinsonismo atípico; por exemplo, pode documentar diminuição do diâmetro ântero-posterior mesencefálico na paralisia supranuclear progressiva (PSP) em estádio moderadamente avançado (13, 14, 15), bem como atrofia do tronco cerebral e cerebelo ou hipointensidade putaminal na margem externa do putamen em sequências T2 na atrofia multissistémica (MSA) (16, 17). No entanto, a sensibilidade da RMCE convencional é sub-óptima para distinção da DP de outros síndromes parkinsónicos (18, 19). A RMCE não é necessária num doente com apresentação clássica de DP, sem outros sinais neurológicos associados, e boa resposta à levodopa. Técnicas avançadas de RMCE, que incluam sequências para estudo da neuromelanina da substância nigra e do locus coeruleus, e do nigrossoma-1 (hiperintensidade dorsolateral da substância nigra em 3 e 7 Tesla) são bons marcadores de parkinsonismos neurodegenerativos, e têm excelente valor no diagnóstico diferencial entre DP e sujeitos saudáveis (20, 21). O SPECT cerebral com Ioflupano (imagem funcional de transportadores dopaminérgicos présinápticos) permite distinguir doentes com DP ou outros síndromes parkinsónicos associados a degeneração nigroestriada (ex: MSA, PSP e degeneração corticobasal) de controlos, de doentes com tremor essencial ou ainda doentes com parkinsonismo iatrogénico, mas não diferencia a DP dos outros síndromes parkinsónicos atípicos (18, 22, 23, 24,25).

Terapêutica:
O tratamento dos doentes com DP considera vários factores, incluindo os sinais e sintomas, idade, estadio de doença e grau de incapacidade funcional. Existem tratamentos farmacológicos, não-farmacológicos e cirúrgicos. A terapêutica a utilizar inicialmente depende das características do doente. Entre as mais utilizadas, destacam-se a levodopa/carbidopa ou levodopa/benzerazide, os agonistas dopaminérgicos e os inibidores da monoamina oxidase-B (26). Além dos sintomas motores, podem existir sintomas não-motores potencialmente incapacitantes, que incluem manifestações neuropsiquiátricas como a ansiedade, apatia e depressão, disfunção cognitiva, alucinações e outros sintomas psicóticos; perturbações do sono como a insónia, a perturbação do comportamento associado ao sono REM e sonolência diurna; e problemas disautonómicos, como a hipotensão ortostática, disfunção urinária e sexual, e obstipação. Existem diversas intervenções terapêuticas clinicamente úteis (com níveis diversos de evidência) para os vários sintomas não-motores (27). Há diversas intervenções não-farmacológicas que têm diferentes graus de evidência da sua eficácia e segurança. Por regra, têm por objectivo a melhoria de sintomas axiais como a fala, deglutição, marcha, bloqueios na marcha e quedas. A fisioterapia, o treino de estratégias de movimento baseadas no exercício como aquelas que usam pistas externas ou treino do equilíbrio, o exercício padronizado formal como diversas formas de dança, a terapia da fala e para a deglutição, e a terapia ocupacional são consideradas possivelmente úteis e seguras, embora a fisioterapia seja aquela que tem dados mais robustos a suportar a sua eficácia (13, 28- 33). Existem diversas intervenções farmacológicas para o tratamento das complicações motoras induzidas pela levodopa (flutuações motoras e discinésias) (26). Nos casos em que a terapêutica médica optimizada não controla de forma satisfatória as complicações motoras, os doentes são candidatos a terapêuticas avançadas, que podem ser farmacológicas ou cirúrgicas. As farmacológicas incluem as injecções de resgate de apomorfina sub-cutânea para episódios graves de off, e as bombas de perfusão contínua de apomorfina e de gel jejunal de levodopacarbidopa para redução da duração e gravidade dos períodos off e das discinésias. A cirurgia consta na estimulação cerebral profunda (deep brain stimulation), usualmente no núcleo subtalâmico (34).

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